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  • Foto do escritorTânia d'Arc

Aglaé Gil



Aglaé Gil da Silva é curitibana, tem 64 anos, formação em letras (português) e trabalha com a língua portuguesa há 34 anos, como revisora, orientadora textual e consultora.


Publicou Memórias de uma fruta madura e O livro que me escreveu.


Fez parte da Antologia Tuíra e fez a editoração e transcrição da linguagem de final do século XIX e início do século XX para o atual uso da língua em: Francisca viva e Caleidoscópio do passado.


 

Alguns trechos da autora



Metáforas dos dias


Algumas palavras que me arranhavam as gavetas da alma, eu já não disse. Não faziam mais qualquer sentido. A boca parecia costurada com linha colorida, como nas bonecas de pano. E o silêncio tinha um gosto de pão amanhecido e cheiro de café que esfriara na caneca. Entretanto, isso tudo era preferível a usar as palavras guardadas desde um tempo tão remoto que até a memória delas tinha tons sépia. Não que eu tivesse alternativa, já que os ouvidos estavam mais moucos do que sempre e as mentes tão rasas que repetiam atitudes burras travestidas de razão. Não que eu fosse genial, mas bem que sabia sair de labirintos maiores, quando os reconhecia construídos por mãos de papelão e transístores. Algumas palavras eu jamais diria. E o bolor que tais palavras criariam talvez fosse útil nos porões onde, deitados, os vinhos esperam por bocas e festins.



Em Memórias de uma fruta madura.





Relembrança


(...) Eu me lembro da vida beijando meu rosto em um dia que era de chegada e suave perfeição. Eu me lembro do cheiro, do hálito sagrado que soprava alegria e molhava minha pele de esperança e um imenso bem-querer.



Em Memórias de uma fruta madura.





Leio Hilda


(...)


Queriam-me em caixas tão pequenas!

E eu lia Dante.

Queriam-me malas prontas para ficar.

Eu partia, a pé.

De uma janela alguém me via: Quem vem lá?

— Aglaé.

— Ela não tem casa? Não tem pai, não tem mãe?

— Não sei. Ela sempre vem e vai sozinha.

Ganhava pouso, comida.

Pagava com poesia.

E partia.

Um dia de um jeito, outro dia do outro.

Como capitular essa mania arredia de me soltar e me lançar?

Não há meio.

Não há por quê.

Eu numero aqui, porque esta é a marca da Senhora Sem Destino que sempre serei.

Já depois de a cera ter derretido e Ícaro ter descoberto que só voaria por dentro

e depois — daqui para lá.

Querem-me na caixa da velhice.

Leio Hilda.

E me deito, nua.

Diria ela:

"Olha-me de novo. Com menos altivez e mais atento."


Em O livro que me escreveu.


 

Livros

Memórias de uma fruta madura (Insight, 2015)

O livro que me escreveu (Donizela, 2024)

 

Coautorias

Tuíra (Marianas Edições, 2021)

 

Saiba mais sobre Aglaé Gil

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